Por Letícia Fucuchima — De São Paulo
04/01/2021
O governo federal pretende retomar os leilões para contratação de energia elétrica em 2021, após os certames previstos para o ano passado terem sido cancelados por causa da pandemia, que levou a uma forte queda do consumo de energia nos primeiros meses e trouxe incertezas sobre o crescimento do mercado.
Especialistas avaliam como positiva a volta dos leilões, mas acreditam que a demanda, ditada pelas distribuidoras, tende a ser baixa. Isso porque, além de várias distribuidoras já estarem com sobras de energia nos contratos, o mercado cativo vem sofrendo diminuição, tanto pelo crescimento do ambiente de contratação livre (ACL) quanto pela expansão acelerada da geração distribuída via energia solar.
Segundo cronograma lançado pelo Ministério de Minas e Energia (MME), até 2023 serão realizados até oito leilões de energia “nova”, ou seja, gerada por usinas que ainda serão construídas.
Para 2021, estão previstos quatro certames. Em junho, são esperadas licitações “A-3” e “A-4”, isto é, contratando usinas para entrar em operação comercial em três e quatro anos, respectivamente. Já em setembro, os leilões seriam do tipo “A-5” e “A-6” (início de fornecimento em cinco e seis anos, respectivamente).
“Há uma tendência de se contratar cada vez menos no mercado cativo. Consequentemente, os leilões tendem a ter muita oferta mas pouco projeto contratado”, afirma Nivalde de Castro, coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Gesel-UFRJ). Como exemplo, ele cita o leilão “A-6” de 2019, quando foram contratados 3 gigawatts (GW) de potência de um total de 100 GW ofertados.
Os principais motivos por trás disso, segundo Castro, são o crescimento do mercado livre – no qual consumidores compram energia diretamente do fornecedor – e a proliferação da “geração distribuída”, pequenos sistemas de geração (solar, principalmente) construídos no ponto de consumo ou próximos a ele.
O coordenador do Gesel ressalta ainda que o leilão é um importante instrumento para viabilizar a expansão do sistema de geração, e diz ver como positiva a manutenção dos leilões por fonte, o que garante a diversificação da matriz brasileira.
Nos leilões “A-3” e “A-4” de 2021, poderão participar empreendimentos hidrelétricos, eólicos, solares fotovoltaicos e térmicas a biomassa. Já os “A-5” e “A-6” incluem essas fontes e também térmicas a carvão, térmicas a gás natural (sem restrição de limite de inflexibilidade operativa) e usinas de recuperação energética de resíduos sólidos urbanos.
“Com a informação que temos hoje, vemos uma demanda baixa para esses leilões, devem ser pequenos”, afirma Luiz Barroso, presidente da consultoria PSR. Ele aponta que o cálculo de demanda das distribuidoras não é trivial, já que envolve não só as projeções de crescimento de mercado, mas também a entrada e saída de contratos no portfólio.
Um executivo do setor, que falou sob condição de anonimato, levantou dúvidas sobre a viabilidade do cronograma de leilões. Ele aponta que a situação de sobrecontratação das distribuidoras piorou com a pandemia, que trouxe mudanças no padrão de consumo de energia, em sua avaliação. A fonte destaca ainda que contratar mais energia do que o necessário pesaria, em última instância, no bolso do consumidor.
Já para o gerente da Thymos Energia, André Fonseca, o calendário de leilões até 2023 reflete a melhora do consumo de energia, que está em trajetória firme e gradual de retomada desde setembro, após a retração sofrida até junho. Para o especialista, uma segunda onda da Covid-19 no Brasil não deverá ter impactos tão grandes sobre o consumo como os vistos no início de 2020. “A retomada tenderia a ser mais rápida”.
Em 2021, também estão previstos certames de energia existente, isto é, gerada por empreendimentos já construídos. Nessa modalidade, o governo prevê retomar os certames “A-4” e “A-5”, que estavam previstos para este ano e servirão para substituir um conjunto de térmicas com contratos vencendo a partir de 2023. A princípio, essas licitações foram marcadas para 11 de junho, segundo portaria editada na semana passada.
Além disso, foram agendados para dezembro os leilões “A-1” e “A-2”, que servem para “rebalancear” os contratos das distribuidoras para atendimento aos consumidores no curto prazo.
O cronograma do MME indica ainda a possibilidade de realizar, no próximo ano, a contratação de reserva de capacidade, caso estudos da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) apontem necessidade. Instituída pela medida provisória (MP) 998, a modalidade “reserva de capacidade” funcionaria de forma similar aos antigos leilões de “energia de reserva”, que pararam de ser realizados em 2016. Porém, em vez de energia, contrataria suprimento “na ponta”, ou seja, atributos que agreguem segurança para o sistema elétrico.
Fonte: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2021/01/04/leiloes-de-energia-retornam-em-2021.ghtml