Proposta cria certificado para biogás elétrico e estabelece metas vinculadas à redução de metano por meio de biodigestão e usinas térmicas a RSU
O Senado deve receber nas próximas semanas o Projeto de Lei “Metano Zero”, iniciativa construída com o suporte da Associação Brasileira de Recuperação Energética de Resíduos (Abren) e que visa criar um marco legal para fomentar a geração de eletricidade a partir de resíduos orgânicos, com ênfase no biogás, oriundo da biodigestão anaeróbia, e nas usinas de recuperação energética de resíduos sólidos urbanos (WTE, na sigla em inglês).
O texto, que está em fase final de ajustes com a consultoria legislativa do Senado, propõe a criação de um certificado de origem exclusivo para o biogás usado na produção de eletricidade, o “Metano Zero”, e estabelece metas vinculadas às diretrizes climáticas do Acordo de Paris. Segundo o presidente da Abren, Yuri Schmitke, a proposta foi desenhada como alternativa à ausência de políticas públicas específicas para o setor, como leilões de capacidade dedicados ao biogás ou à recuperação energética. “Sem um marco regulatório claro, os projetos continuarão pontuais e dispersos. O Metano Zero visa consolidar um mercado de energia renovável com foco em reduzir emissões de metano, um dos gases de efeito estufa mais potentes”, afirmou. O PL abrange duas principais tecnologias: a biodigestão anaeróbica, usada na produção de biogás a partir de resíduos agropecuários e orgânicos urbanos, e a recuperação energética por tratamento térmico, que consiste na incineração controlada de resíduos sólidos urbanos em usinas WTE.
Ambas as tecnologias eliminam a necessidade de destinação em aterros sanitários, principal fonte de emissões de metano no setor de resíduos. De acordo com Schmitke, cerca de 90% do metano liberado pelos resíduos no Brasil poderia ser evitado com a implantação dessas soluções. Um dos pilares do projeto é a criação de um “balcão único” de contratação de energia elétrica gerada a partir de resíduos, com regras simplificadas e metas explícitas para o setor. O modelo busca atrair investimentos privados e criar previsibilidade para o desenvolvimento de novos empreendimentos.
Além disso, o certificado Metano Zero funcionará como instrumento de rastreabilidade e valorização ambiental da energia produzida com biogás, fomentando um mercado secundário de energia limpa com benefício ambiental comprovado.
Atualmente, o Brasil conta com cerca de 350 MW instalados de biogás para geração elétrica. No entanto, esse número representa apenas uma fração do potencial estimado, na avaliação da Abren.
Para Schmitke, a ausência de uma política de contratação estruturada e a falta de integração entre as agendas de energia e meio ambiente têm limitado o avanço do setor.
“O metano é até 86 vezes mais potente que o CO₂ como gás de efeito estufa e está presente em quase metade das emissões nacionais, especialmente devido à decomposição de resíduos em aterros”, alerta. Ele lembra que o país é signatário do Compromisso Global do Metano, que estabelece a meta de reduzir em 30% essas emissões até 2030, e que a proposta legislativa está alinhada a esse esforço.
WTE
Enquanto o governo federal ainda não oferece instrumentos estruturados para o segmento, alguns estados e municípios vêm avançando.
Em São Paulo, cinco projetos de usinas WTE já obtiveram licenciamento ambiental, todos voltados à recuperação energética de resíduos sólidos urbanos por meio da incineração controlada. É no estado, também, onde a primeira usina de recuperação energética (URE), de 20 MW, da Orizon, em obras, entrará em operação, em 2027, a partir da queima direta de resíduos sólidos urbanos.
A capital paulista, porém, maior cidade do país, deve ser a grande impulsionadora da solução. Isso porque a prefeitura condicionou a renovação de contratos das duas concessionárias de coleta de lixo da cidade, a Ecourbis e a Loga, à construção, em uma primeira fase até 2028, de duas UREs, cada uma delas com capacidade para tratar mil toneladas por dia de rejeitos e com 30 MW e potência.
O planejamento da cidade envolve ainda a possibilidade de mais duas usinas, de mesma capacidade, para 2035, uma para cada concessionária, o que elevará a capacidade de UREs na cidade para 120 MW, a partir de 4 mil t/dia de resíduos tratados.
Outro projeto importante no estado que sairá nos próximos anos é do consórcio regional Consimares, de 750 t/dia e 22,5 MW, formado por sete cidades, e que está apenas no aguardo da aprovação final de dois municípios para a publicação do edital de concessão.
Neste caso, aliás, há a expectativa de que o projeto seja ampliado com a entrada de Campinas no projeto, o que agregaria mais 1 mil toneladas por dia de RSUs e portanto poderia mais do que dobrar a potência da usina. Essa possibilidade, porém, que conta com a vontade política da prefeitura, ainda precisará ser discutida e aprovada pela câmara municipal.
Fonte: https://brasilenergia.com.br/energia/bioenergia/metano-zero-quer-ampliar-uso-energetico-de-residuos