Esse caminho tem sido visto como um dos mais promissores para a valorização dos resíduos – especialmente no Brasil, que apresenta grande potencial de produção de biogás e biometano
Por Estadão Blue Studio, 05/06/2025 | 12h21
O aproveitamento energético dos resíduos já é realidade em muitos países, como China, Alemanha, França e Japão, que instalaram grande número de usinas de recuperação energética, também conhecidas como WtE, abreviação de Waste-to-Energy (“Lixo para Energia”). Estima-se a existência de pelo menos 3 mil empreendimentos desse tipo espalhados pelo planeta, contribuindo fortemente para reduzir a disposição em aterros. Um ícone do segmento é a usina Amager Bakke, em Copenhague, capital da Dinamarca – que, além de gerar energia elétrica e térmica para 150 mil residências, funciona como centro de lazer urbano, com pista de esqui e parede de escalada.
Enquanto isso, o Brasil conta com menos de uma dezena de projetos de WtE em desenvolvimento. “Mas é preciso ressaltar que o País possui uma das maiores oportunidades globais para transformar resíduos em energia, tanto pelo volume de Resíduos Sólidos Urbanos gerados nas grandes metrópoles quanto pelo enorme potencial de biogás e biometano nos setores sucroenergético e agroindustrial”, destaca Yuri Schmitke, presidente da Associação Brasileira de Energia de Resíduos (Abren).
De acordo com projeções da entidade, o Brasil tem potencial técnico de 3,3 GW de capacidade instalada de projetos de WtE, levando-se em conta apenas 28 regiões metropolitanas – esse número equivale a 1,6% da atual capacidade instalada de geração de energia elétrica no País. O Brasil aproveita atualmente não mais que 3,4% do seu potencial de biogás, produzindo 2,9 bilhões de Nm³ (metros cúbicos normais) por ano, dos 85 bilhões possíveis, e 1,4% do potencial de biometano (0,63 bilhões de Nm³/ano, frente aos 44,1 bilhões estimados).
Tudo isso gera não apenas danos ao meio ambiente, mas, também, um grande desperdício de recursos financeiros, tanto de forma direta quanto indireta. A Abren estima que, ao longo dos próximos 40 anos, o custo associado à não implementação de usinas de WtE nas principais regiões metropolitanas representará um prejuízo de R$ 71 bilhões em gastos com saúde pública, R$ 104 bilhões em danos ambientais e mais de R$ 200 bilhões em arrecadação tributária. “Adicionalmente, o País deixa de gerar mais de 200 mil empregos e mitigar 86 milhões de toneladas/ano de CO₂ equivalente”, acrescenta Schmitke.
Valorização do biometano
A Abren defende, como ações prioritárias para impulsionar a valorização dos resíduos no Brasil, a aprovação do Programa Nacional de Recuperação Energética de Resíduos (PNRE), proposta legislativa em tramitação no Congresso Nacional, e a regulamentação da Lei do Combustível do Futuro – que, sancionada em outubro passado pelo presidente Lula, incentiva a produção de biometano em aterros sanitários.
Trata-se de promover a descarbonização gradual do setor de gás, a partir da mistura do biometano ao gás fóssil de petróleo, mais conhecido como gás natural. A meta é começar essa inclusão em 2026, com 1% de biometano adicionado ao gás natural comercializado, com aumento gradual dessa participação. Consolida-se, assim, o papel da cadeia de resíduos como vetor estratégico para a descarbonização e a economia circular.
A estimativa da Abren é de que, somando-se as iniciativas consideradas prioritárias a algumas estratégias complementares, a exemplo de incentivos fiscais para usinas WtE e promoção de leilões ou contratos de autoprodução de energia, seria possível destravar mais de R$ 500 bilhões em investimentos privados.
De acordo com uma linha do tempo construída pela Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (Abrema), o papel do biometano na matriz energética brasileira vem sendo fortalecido desde a criação da Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio), em 2017, quando foram estabelecidas metas anuais de descarbonização para as distribuidoras de combustíveis. Novo avanço ocorreu em 2021, com a Nova Lei do Gás, que facilitou o acesso dos produtores à infraestrutura de distribuição de gás natural. Com isso, o biometano passou a ser inserido diretamente na rede de gasodutos.
